terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Angelus Novus e Walter Benjamin: A visão da História.





Walter Benjamin foi um dos grandes pensadores do século XX, e em seu artigo sobre História intitulado sobre o conceito de história. Benjamin discute e analisa uma nova abordagem sobre o entendimento da Teoria da História e suas conjunturas com o "materialismo histórico" de Karl Marx.

O quadro pertencia ao filósofo judeu-alemão, e encontra-se, atualmente, no Museu de Israel em Jerusalém. Na época que deparou-se com o quadro, Benjamin vivia uma existência errante - morando em quartos baratos de pensões ordinárias - e melancólica, devido, em grande parte, por ter sido recusado como livre-docente da Universidade de Frankfurt, pois sua tese intitulada A origem do drama barroco alemão possuía sérias críticas aos padrões acadêmicos vigentes e também por ter sentido na pele a eclosão do sentimento anti-semita na Alemanha pré-nazista.

A questão é que talvez essa obra de Klee não tivesse alcançado tanto reconhecimento como uma das obras de arte mais significativas do começo do século XX se não tivesse fascinado tanto Walter Benjamin. O olhar alerta e furioso do anjo, suas asas abertas que nos lembram também garras afiadas e os dentes à mostra de modo que mais parecem presas, para Benjamin, configuram uma poderosa imagem da história. Os seus olhos enxergam a imensa série de massacres e catástrofes promovidas pela humanidade ao longo do passado. Impotente, ele não pode voltar para redimir os mortos e limpar essas ruínas sob as quais jazem incontáveis cadáveres. Um vento misterioso o arrasta em direção ao futuro. Através dos olhos de Angelus Novus, Walter Benjamin,na obra Magia e técnica, arte e política, viu uma poderosa imagem da história caracterizada pela mistura dos tempos e pela barbárie que existe por trás das conquistas da civilização europeia.

Confira o trecho citado:


“Minhas asas estão prontas para o vôo,
Se pudesse, eu retrocederia
Pois eu seria menos feliz
Se permanecesse imerso no tempo vivo."
Gerhard Scholem, Saudação do anjo 


Há um quadro de Klee que se chama Angelus Novus. Representa um anjo que parece querer afastar-se de algo que ele encara fixamente. Seus olhos estão escancarados, sua boca dilatada, suas asas abertas. O anjo da história deve ter esse aspecto. Seu rosto está dirigido para o passado. Onde nós vemos uma cadeia de acontecimentos, ele vê uma catástrofe única, que acumula incansavelmente ruína sobre ruína e as dispersa a nossos pés. Ele gostaria de deter-se para acordar os mortos e juntar os fragmentos. Mas uma tempestade sopra do paraíso e prende-se em suas asas com tanta força que ele não pode mais fechá-las. Essa tempestade o impele irresistível-mente para o futuro, ao qual ele vira as costas, enquanto o amontoado de ruínas cresce até o céu. Essa tempestade é o que chamamos progresso.


Em um ensaio intitulado "Benjamin y lo demoníaco", o filósofo italiano Giorgio Agamben ressaltou que essa leitura realizada do quadro de Paul Klee pelo pensador judeu-alemão comporta muitos elementos da cabala judaíca. O jovem Benjamin nutriu um vasto interesse pelos significados da mística judaíca ao ponto de construir uma sólida amizade com o teólogo judeu Gersom Scholem. De acordo com essa liturgia, os anjos também podem ser os portadores de características luciferinas. Podem ser hermafroditas, possuindo aspecto feminino e nome masculino. E nenhum anjo possuia garras afiadas e aspecto de fera quanto Satanás. Destituído das garras e das presas, essa mesma iconografia se torna uma representação de Eros de acordo com o imaginário europeu. Assim, Angelus Novus é o novo anjo, portador de uma mensagem de felicidade que nasce a partir da ruptura das tradições.

O quadro Angelus Novus soa, portanto, como uma crítica a um humanismo hipócrita, que em sua busca de tornar o homem a imagem e semelhança de Deus acabou legitimando inúmeros crimes. Esse anjo decaído pode ser o mensageiro de um humanismo mais autêntico porque é profano e profanador. A felicidade mundana, portanto, histórica, não seria incompatível com uma certa felicidade messiânica. Se essa imagem intrigante e múltipla possibilitou a um intelectual como Walter Benjamin romper com o positivismo, que transformou a escrita da história na mera coleta de fatos e datas, para criar um estilo próprio de pensar cientificamente a partir do delírio, da mística e do devaneio, precisamos dar mais atenção ao que esses olhos raivosos querem nos comunicar.




Walter Benedix Schönflies Benjamin nasceu no seio de uma família judaica, filho de Emil Benjamin e Paula Schönflies Benjamin, comerciantes. Na adolescência, participou do Movimento da Juventude Livre Alemã, de tendência socialista.

Em 1915, conhece o filósofo e historiador Gerschom Gerhard Scholem, de quem se torna grande amigo.

Após estudar filosofia na Universidade Freiburg im Breisgau, doutorou-se pela Universidade Bern, em 1919, com a tese O conceito de crítica de arte no romantismo alemão.

Com a ascensão do nazismo ao poder, Benjamin, já abalado por dificuldades materiais, exilou-se em Paris, em 1935.

Com a invasão da França pelos alemães, em 1940, juntou-se a um grupo de refugiados que tentava a fuga pelos Pireneus. Detido na fronteira pela polícia espanhola, que ameaçou entregar o grupo à Gestapo, Benjamin suicidou-se. No dia seguinte, contudo, as autoridades permitiram a passagem do grupo.



Crítico de idéias e fatos

Walter Benjamin é considerado um dos mais importantes pensadores modernos. Em vida, seus escritos não alcançaram repercussão, embora ele já fosse respeitado em alguns círculos, conseguindo o estímulo decisivo de filósofos como Ernst Bloch e T. W. Adorno.

Adorno, aliás, responsável pela edição póstuma das obras de Benjamin, considerou-o antes de tudo como um filósofo que teria tentado subtrair-se ao pensamento classificatório, filosofando contra a filosofia.

O que mais interessa na obra crítica de Benjamin é a abordagem de temas concretos da literatura, da arte, das técnicas, da vida social, etc., sem abandono do rigor conceitual. Benjamin é, por isso, além de filósofo, um crítico de ideias e fatos.

Os escritos de Benjamin ficaram esparsos em periódicos e só três livros foram por ele publicados em vida. Além de sua tese de doutoramento, publicou uma tese reabilitando o barroco alemão (Origem da tragédia alemã) e um volume de ensaios e reflexões (Rua de mão única), ambos em 1928.

Entre seus ensaios destacam-se "As afinidades eletivas de Goethe", "Sobre alguns temas em Baudelaire", "Teses sobre filosofia da história", "Paris, capital do século 19" e "A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica".



Para saber mais:

BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política.

LOWY, Michael. Walter Benjamin - Aviso de Incêndio - Uma Leitura das Teses " Sobre o Conceito de História ".


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